Monteiro Lobato retratou figuras de sua época com cores fortes, que ganharam dimensões universais. O 'Jeca Tatu', aquele que não faz nada, desanimado, pinguço, opilado, ignorante, etc, é um desses personagens.
É Rui Barbosa, que ao falar em um discurso sobre o livro "Urupês" chamou a atenção para o personagem, ao perguntar: - "Senhores: Conheceis por ventura o admirável escritor paulista? Tivestes, algum dia, ocasião de ver surgir, debaixo desse pincel de uma arte rasa, na rudeza, aquele tipo de raça, que 'entre as formadoras de nossa nacionalidade' se perpetua a 'vegetar de cócoras', incapaz de evolução e impenetrável ao progresso?"
Jeca Tatu era a figura típica, que marginalizado da sociedade do pós ciclo do ouro, e que só usava mão de obra escrava na lavoura, morava no mato numa casinha de sapé. Vivia na maior pobreza, em companhia da mulher magra, feia, doente e de uma penca de filhos pálidos e tristes. Passava os dias de cócoras, pitando enormes cigarros de palha. Ia caçar no mato, tirar palmito, pescar uns lambaris no ribeirão que passava ao lado da casebre; não plantava, nem um pé de couve - pois: "Não paga a pena; formiga corta tudo..."
Jeca Tatu era o mestiço de branco com índio. Não era branco; não era índio...
Criticado por quem não conhecia a realidade do campo, Lobato, tempos depois, escreveu uma história para crianças: "O Jeca Tatuzinho" - divulgada no Almanaque Biotônico Fontoura. Jeca Tatu ganhou um novo status. Passou a usar botina, cuidou da saúde, tornou-se um trabalhador, deixou o "modorrar" silencioso, triste de quem não vive. Passou a ocupar um lugar na sociedade.
Muita coisa mudou. O caipira ainda existe. Sabe filosofar e rir de si próprio. Do seu jeito de falar, de ser... Mas, alguns ainda são reticentes ao trabalho e preferem modorrar no meio de tanta fartura e beleza; preferem comportar-se como "Orelha de pau" que nasce e morre em pau podre.
O sistema politico, econômico e social permitiu criar o tipo "Jeca" tanto no passado, como no atual, em pleno século XXI. Este não usa botina. Mas morre de tudo: maleita, dengue, tuberculose, drogas, violência de todos os tipos...
Educação, valorização do conhecimento, mais liberdade de iniciativa na área produtiva, menos burocracia e interferências governamentais podem resolver inúmeros problemas dos nossos "caipiras" tanto do sertão, como das cidades. Criatividade é o que não lhes falta.